terça-feira, 3 de maio de 2011

Entrevista com Ivana Domenico



Cantora, atriz, amiga querida e referência dentro do circuito carioca do teatro musical, Ivana Domenico já esteve presente em algumas das montagens mais importantes do teatro musical no Brasil, dentre elas 7 - O Musical, Ópera do Malandro, Lado a Lado com Sondheim, As Malvadas e Hairspray e agora prepara-se para estrear um show de jazz. A atriz me cedeu uma longa (e deliciosa) entrevista, onde foi aborado o assunto carreira, a situação cultural no Brasil, idade, projetos futuros, além de abordar seu sucesso como cantora na década de 90, fazendo frente ao maior ídolo rock da época, Cássia Eller. Ivana ainda define o termo "cantriz" e diz que, num país onde tudo é rotulado, este rótulo é bem interessante. Também abre espaço para uma possível produção conjunta comigo. Abaixo a entrevista com aquela que chamo (e sempre chamarei) de "Rainha ds musicais".


Bruno Cavalcanti: Você esteve em cartaz em musicais importantíssimos como 7 – O Musical, Ópera do Malandro, Cole Porter – Ele Nunca Disse que me Amava, Hairspray, Sassaricando e Lado a Lado com Sondheim. Qual o sentimento de saber que você está ligada diretamente com os musicais que mais marcaram história no Brasil?

Ivana Domenico: É um privilégio poder participar desse renascimento dos musicais no Brasil. E mais feliz ainda fico em poder afirmar que eu fui uma das pioneiras juntamente com outras "cantrizes" tão maravilhosas. Certamente é um grande privilégio

BC: Dentre os nomes do teatro musical você é uma grande referência. Como nasceu sua carreira no teatro musical?

ID: Eu sou basicamente uma cantora, que fez um pouco de teatro, mas, inicialmente fui lançada como cantora de Rock nos anos 90. Isso rendeu um certo sucesso e um “buxixo” se formou pela cidade. Também participei de alguns programas de TV como: Jô Soares Onze e Meia, Serginho Groisman, Sem Censura. Até que, depois que voltei dos EUA, a dupla genial Charles Möeller e Cláudio Botelho estavam procurando uma quinta mulher para fechar o elenco de seu primeiro musical enquanto diretores, As Malvadas. E foi com uma indicação da cantora Gottsha, que me conhecia desse show de Rock, que fui parar dentro da casa dos dois, e onde eles fizeram o convite. De lá pra cá, pude participar de grandes montagens da dupla, sendo a "cantriz" que mais fez trabalhos deles até hoje. E posteriormente também trabalhar com outros diretores como Paulo Afonso de Lima, Wolf Maia e Miguel Falabella.

BC: Você e uma das atrizes que mais fez musicais da grife “Möeller e Botelho” (disputando o título com Ada Chaseliov apenas), qual sua relação com a dupla?

ID: Minha relação é de gratidão pela confiança que eles sempre depositam em mim para desempenhar papéis que saem (ou não) da cabeça deles. Já tive o privilégio de terem sido criados para mim personagens como a lendária Pombinha Vanessa (Cole Porter - Ele Nunca Disse que me Amava) e a Ariranha Assassina (Cristal Bacharach). Como não agradecer por esses momentos? E claro, temos uma relação de carinho, afeto, respeito, e isso é muito bom. Somos amigos. Eu adoro aqueles dois, que até hoje chamo de "meninos"…

BC: No mercado musical há uma elite chamada de “cantrizes”. Você se sente uma “cantriz”? Sabe definir o que vem a ser uma “cantriz”?

ID: Acho criativo esse nome, cantriz. E uma boa maneira de definir o que somos, ou o que fazemos. Já que tudo nesse país precisa de um rótulo, esse é bem bacana. É normalmente usado para definir atrizes que cantam, ou cantoras que atuam. Exemplo: a Cláudia Raia é uma atriz que pode cantar; Eu sou uma cantora que posso atuar. Às vezes tem uma coisa que você desempenha melhor que outra. Mas existem muitas boas profissionais que fazem tudo muito bem. Um dia eu chego lá.

BC: Sua presença no teatro é quase certa, no entanto é extremamente raro vê-la na TV. Por quê? É uma escolha sua fazer apenas teatro ou faltam convites para migrar para a televisão?

ID: A televisão nunca foi um sonho. E por incrível que pareça, nem o teatro. Foi uma porta que se abriu, e graças a Deus nunca mais se fechou, pois me tornei uma apaixonada pelo teatro musical, e não consigo imaginar minha vida sem ele. Foi ele que me deu tudo o que eu tenho, e tudo o que conquistei. Já fiz algumas coisas para TV sem muita importância ou destaque. E realmente nunca foi meu foco. O grande sonho da minha vida é ser cantora. Só cantora. Por isso nunca me esforcei para ir para a TV. Sempre achei que fosse enveredar de vez para o caminho da cantoria.

BC: Você fez Lado a Lado com Sondheim, a primeira montagem do musical na América do Sul. Qual a emoção de saber da presença de Sondheim na plateia?

ID: Eu já conhecia o Sondheim de uma outra vez que ele esteve presente em uma montagem dos "meninos", o Company. E já ali, havia ficado emocionada com sua presença pela grande importância que ele tem dentro do Teatro Musical mundial. Mas saber que ele está te vendo, é realmente algo indescritível… parece até uma mentira de tão maravilhoso que essa possibilidade possa ser. E ele é um gentlemam, além de magnífico naquilo que faz. Ele é único. Não existe ninguém que se compare a ele no mundo hoje em dia.

BC: O teatro musical atingiu um patamar de excelência no Brasil que faz com que não devamos nada a Broadway. No entanto a grande massa não tem acesso aos musicais que ficam restritos muitas vezes à elite ou à classe média de maior conhecimento cultural. Você concorda com a falta de massa popular no teatro musical?

ID: Isso não acontece só com o Teatro Musical aqui no Brasil. As grandes massas mais populares não tem acesso à cultura de nenhuma espécie. E é muito triste. Lamentável, eu diria. Sinto, mas infelizmente eu sozinha não posso fazer nada. Cultura e Educação não são prioridades no Brasil. Aliás, nada é prioridade aqui. Não temos um sistema de saúde digno; não temos uma polícia digna; não temos saneamentos dignos; não temos comida digna, empregos… não temos políticos dignos. Ah, temos a roubalheira digna, isso temos. Daí, diante de tudo isso, o que eu, uma simples artista posso fazer? Aqui no Rio, ainda existe uma lei muito legal que permite que a grande massa da população possa assistir as peças que estão em cartaz na rede Municipal de teatros. É chamado "O dia de 1 real". Onde o povo só paga 1 real para ver essas peças. E posso afirmar, que "O dia de 1 real" é o dia mais emocionante e gratificante que eu, como artista e como ser humano já pude presenciar na minha vida. Viva "O dia de 1 real"!

BC: Em toda a sua carreira, quando você olha para trás, há algum momento, algum trabalho, do qual você mais se orgulhe? E há algum que você se arrependa de ter feito.

ID: Tudo o que eu já fiz tem um valor muito grande pra mim. No sentido de aprendizado em todos os aspectos. Não me arrependo de nenhum espetáculo que eu tenha feito, porque tenho o privilégio de ter feito somente coisas boas. Mas existe um, em particular, que não gosto de me lembrar de como éramos tratados pela produção do mesmo. Mas que era muito bom de fazer. Não acho elegante mencioná-lo. Do resto só tenho lembranças maravilhosas, mas não posso deixar de ressaltar o dia da estreia de Cristal Bacharach, onde no número da Ariranha, a plateia não se conteve e fui ovacionada por mais de dois minutos com todos de pé no final do número
“Don't Make me Over”. Aquele momento levarei para sempre.

BC: Dentro do teatro musical você já trabalhou com diversos diretores, dois dos mais conhecidos foram Miguel Falabella e a dupla Charles e Cláudio. Você pode definir como é trabalhar com esta variedade de diretores?

ID: Eles vêm de escolas diferentes. Cada um com suas particularidades e forma de trabalhar. Gosto e respeito muito todos eles. Pra mim sempre será um prazer tê-los como parceiros de trabalho. E sempre será um grande e bom acontecimento trabalhar com todos. São todos maravilhosos.

BC: Ivana Domenico como espectadora. Qual seu musical favorito?

ID: Meu musical favorito é: Tommy, a ópera rock do The Who. Como uma boa roqueira, não posso negar as raízes. Também acredito que We Will Rock You deva ser maravilhoso. Só as músicas do Queen já valem o espetáculo. Nem precisa ter uma história boa. (risos.) Acho que te decepcionei, né? Desculpe.

BC: Atores e atrizes favoritos?

ID: Existem colegas de profissão que são realmente muito bons no ofício. Não tenho um(a) favorito. Não acho elegante falar muito bem, ou muito mal.

BC: Você trabalha constantemente com musica. É uma ouvinte ávida ou prefere o silêncio?

ID: Acho que se um dia eu fosse proibida de ouvir música, ficaria louca. Meu pai sabia disso, e a forma que ele encontrou de me punir por não ter conseguido boas notas no colégio, foi confiscando meus discos e meu rádio. Acho que isso responde tudo. (risos)

BC: Há algum trabalho (dentro ou fora do teatro) que você deseje fazer e ainda não tenha feito?

ID: Eu queria fazer o papel da Tina Turner em Tommy. Ela é a Acid Queen. Uma pequena aparição, mas que rouba a cena, claro.

BC: Os fãs de Ivana Domenico como são (sem contar a mim)? São do tipo que gritam por você se te encontram na rua ou são do tipo mais calmo, com os quais você poderia parar para tomar um Chopp?

ID: Meus fãs são óptimos, como você. Sou amiga de vários deles. Saímos pra tomar café, vamos a shows juntos, cinema, enfim… Adoro! São meus amores.

BC: Ivana fora dos palcos? Como é sua personalidade? Seus medos e esperanças? Como é a Ivana dona de casa que cuida da cachorrinha e dos afazeres domésticos?

ID: Eu tenho uma personalidade bem forte, pois perdi minha família bem antes dos 30. Isso fez com que eu criasse uma armadura para me proteger do mundo. Mas lá no fundo sou uma menininha. E uma palhaça também. Sou uma boa dona de casa e mãe também. (risos). Tenho medo da solidão e de morrer sozinha. E sonho em um dia só poder cantar e viver dignamente só fazendo isso.

BC: O maior sonho de Ivana Domenico profissional e pessoal?

ID: Queria muito ter uma família novamente. E queria muito ser uma cantora de nome, conhecida e respeitada no mundo todo. Não quero ser a Madonna. Quero ser a IVANA! (risos)
BC: Agora revela só pra mim: Há algum trabalho novo em vista?

ID: Estou montando um show de Jazz com uma pegada teatral. E um visual meio burlesco. Meu cabelo voltará a ser preto. Em breve. Não se assuste. Vou ver também se EU não me assusto, né?(risos)

BC: A Ivana Domenico cantora tem a mesma visibilidade da Ivana Domenico atriz?

ID: A Ivana cantora está a muito tempo adormecida. Mas esse ano ela vai voltar, ah vai! (tisos). Pode procurar uns lugares pra eu cantar aí em Sampa.

BC: Quando lhe chamo de “rainha dos musicais” não minto, afinal você é uma referência para o teatro musical. Como você lida com essa ideia de ser uma referência?

ID: ADOOOOOOOROOOOO quando você me chama de rainha. Ai quem me dera… Mas vou te dizer, não sou tão conhecida assim. Em São Paulo, por exemplo, só quem é do meio me conhece, e mesmo assim mais ou menos, pois em todos os testes que eu vou fazer nem sabem quem eu sou. Estou falando do pessoal da produção, né? Mas, um dia chego lá.

BC: A idade é um carma para você?

ID: Não me importo com a idade não. Tô adorando ter 40 anos, por exemplo. Nós nos sentimos donos de nós mesmos. Você poder ter experiência aliado ao fato de ainda ter uma certa jovialidade, é maravilhoso. É o melhor dos 2 mundos. Eu não troco os meus 40 por nenhum 25, 30, 35… de jeito nenhum.

BC: Agora para encerrar à lá Marília Gabriela: Ivana Domenico por Ivana Domenico? E me diga uma frase, uma música ou algo de referência.

ID: A melhor qualidade que eu tenho é ser amiga de verdade. A pior é o génio ruim. Eu não gosto de frases, porque sou péssima dessas coisas, mas a palavra que escolho é MÚSICA. Essa palavra é tão linda que ela por si só já tem musicalidade. Imagine o mundo sem música… a tristeza que seria isso aqui. Affe! (risos)

BC: Pergunta extra: Você topa participar de uma produção minha? Vamos investir numa parceria?

ID: Amado, seria um prazer poder fazer algo com você. O difícil será coincidirmos as agendas. Mas, quem sabe? Vamos ver. Vai que surge uma óptima parceria aí, né?

Um comentário:

priscila toller disse...

Muito legal essa entrevista Bruno! Vc esta arrasando :)